Body piercer brasileira tem estudado para atender comunidade surda (e quer colaborar para que mais profissionais façam o mesmo)

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A body piercer Ilana Klippel trabalhando pela acessibilidade. Foto: reprodução/Instagram

O body piercing tem se tornado cada vez mais popular mundialmente e nos últimos anos a indústria tem se renovado e se fortalecido. Diferentes públicos querem adornar seus corpos com uma joalheria e um procedimento que tenha segurança e qualidade. O bom atendimento também faz parte de um procedimento seguro.

Pensando nisso, a body piercer profissional Ilana Klippel de Viamão, Rio Grande do Sul, é uma das pessoas que tem inovado na indústria do piercing, buscando se especializar para atender a comunidade surda. E não só isso, mas também está produzindo material educativo para que demais profissionais da área também possam fazer o mesmo.

Ilana nos contou que já atendeu muitos clientes surdos e que fez interpretação para aqueles que buscavam fazer uma tatuagem. Mas foi o contato com uma cliente surda que fazia leitura labial, que a motivou de fato buscar estudar e aprender LIBRAS (Língua brasileira de sinais). A piercer explicou:

“Eu resolvi buscar a LIBRAS quando atendi uma cliente surda e ela fazia leitura labial, mas não oralizada. Então, ela não falava, só escrevia em um papelzinho. Tudo ia tranquilo até que eu tive que pôr minha máscara. Então eu vi que ela já estava com um olhar mais assustado, uma respiração mais ofegante. E naquele momento eu resolvi baixar minha máscara para explicar para ela o que ia acontecer e pedir calma, respiração tranquila. “

Ao final do atendimento usualmente os profissionais do piercing explicam e reforçam os cuidados que precisam ser tomados. Ilana começou a se questionar se o folheto de cuidados que ela entregou para cliente surda seria compreendido. “Será que ela vai saber como cuidar? Será que ela sabe que uma secreção é normal da regeneração da pele naquele momento? Será que ela por acaso não vai ter vergonha de me procurar por medo de ter uma dúvida corriqueira ou com medo de eu não entendê-la?“, foram algumas questões que invadiram a profissional.

A experiência com essa cliente foi um divisor de águas. Depois disso Ilana buscou um curso e encontrou um escola para surdos. Foi acolhida em um curso ministrado por professores surdos. Em sua jornada descobriu que que o modelo de escola inclusiva que existe hoje no Brasil, não comporta uma pessoa surda que, por exemplo, pode ter um intérprete em sala de aula. “Os alunos ouvintes vão o excluir de muitas formas”, pontuou a piercer, que ainda explicou:.

“Quando uma criança surda entra em uma escola para surdos, ela aprende a sua primeira língua, que é a LIBRAS e depois o português. Além disso, os professores surdos em séries iniciais, ajudam no trabalho de percepção de visibilidade para eles. Eles precisam do modelo para se entenderem surdos.”

Em seu trabalho, Ilana adaptou o seu folheto de cuidados, como mostraremos abaixo, deixando-o muito mais visual. “É simples de entender pois muitas vezes o português não é tão dominado por uma pessoa surda“, explicou a profissional. E não parou por aí, colocou sinais de acessibilidade no estúdio em que trabalha e fez camiseta também com sinais, construindo um ambiente inclusivo e acessível para comunidade surda.

Folheto de cuidados da body piercer. Foto: divulgação
Folheto de cuidados da body piercer. Foto: divulgação
Folheto de cuidados da body piercer. Foto: divulgação

Por meio de suas pesquisas, estudos e adaptações para desmontar as barreiras físicas e atitudinais, Ilana descobriu que “não existia sinal para secreção, apenas um sinal para inflamação, mas inflamação sempre remete à algo ruim, então eu busco uma forma de explicar o que ela é, e o que é natural”.

Sobre a importância que mais profissionais se engajem na causa da inclusão e acessibilidade, a body piercer disse:

“Posso te dizer que a contribuição para o profissional piercer é o que sempre buscamos, que é a educação constante de clientes. Pois muitas vezes uma pessoa surda tem vontade de ter o adorno mas tem medo das reações ou de não saber de muitas coisas que esclarecemos com clientes ouvintes.”

Ilana entende que o profissional do piercing não precise – obrigatoriamente – aprender LIBRAS fluentemente, mas acredita que saber o alfabeto já significa algo e conhecer sobre a cultura surda ajuda na quebra de barreiras e estigmas.

Na parte de ajudar colegas de profissão, Ilana nos contou que:

“Eu passei a educar muitos colegas que tinham certa percepção errada também. Muitas vezes a pessoa manda uma mensagem e você vai ler e está em uma estrutura que muitas pessoas até riem. Eu já vejo de outra maneira, além dos surdos têm pessoas cegas ou com baixa visão que usam aplicativos para escrever e se comunicar”.

Por conta da sua formação superior em Enfermagem ela precisou interromper a formação em LIBRAS, por questão de agenda. A sua tristeza foi suprida pelo apoio e incentivo que recebeu de seus amigos surdos, eles disseram, “vai lá, tu precisa te formar em Enfermagem, tu já sabe muita coisa, a gente te ajuda, mas a gente precisa de mais Enfermeiros que saibam LIBRAS também” (sic).

Ilana – que está grávida no presente momento – lembra que buscar se preparar para atender a comunidade surda ou qualquer outra pessoa com deficiência, implica em não tratá-las com dó. Premissa levantada e defendida pelo ativismo das pessoas com deficiência. É preciso entender que cada pessoa é única e funciona de uma determinada forma e está tudo bem.

Todas as pessoas têm potencialidades e limitações e precisamos ter isso sempre claro em nossas mentes. E já que falamos em potencialidades, que o trabalho de Ilana inspire tantas e tantos outros profissionais para muito além da indústria do piercing. O universo agradece.

CONTATO
https://www.instagram.com/piercerilana/

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