Fanpage religiosa no Facebook diz ter descoberto os segredos da tatuagem

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Sem Título-1

Em tempos em que uma legião de imbecis habita as Redes Sociais, me apropriando aqui do termo usado por Umberto Eco, temos que ter muito cuidado para não colaborar na promoção dessa legião. Cada vez que uma pessoa diz a maior bobagem do milênio e nós compartilhamos o vídeo, a foto, a frase, estamos fazendo propaganda para ela. Estamos dando exatamente a audiência e o holofote que ela buscava. Aparentemente o único sentido da vida das pessoas que incorporam essa legião é esse, ser popular ou alimentar uma popularidade através da efervescência de polêmicas. Nesse sentido, vale tudo, mesmo.

O mais recente caso é o da fanpage Vladi Bastos no Facebook, que tem divulgado um vídeo com o título “Descubra os que está por traz de uma tatuagem” (sic). A descrição da página diz que:

“Aqui você encontrará informações sobre comportamento cristão, estudos bíblicos, vídeos Cristãos e muito mais.”

O que não é de todo verdade e pior, sentimos que há uma certa implicância específica com a tatuagem. Há outras postagens sobre o assunto. Além disso, apesar das grandes bobagens e falácias que a página divulga, ela mostra que é popular, no momento em que escrevo, 22.543 pessoas curtiram a página. O vídeo que mencionamos acima já teve 77.101 compartilhamentos e 21.105 curtidas e nos recusamos a compartilhar o vídeo, ainda que seja para tecer uma crítica.

A dupla: demonização e marginalidade
O vídeo se ampara no mais raso discurso do senso comum que entende e trata basicamente a tatuagem como sendo:
1) “tatuagem é coisa do demônio”,
2)”tatuagem é coisa de marginal”;

O problema maior é que boa parte do discurso que eles reproduzem, encontra respaldo em instituições, tal qual a Religiosa (a fanpage é declaradamente religiosa) e, além, a da Polícia Militar, que é responsável por uma cartilha que se propõe a relacionar tatuagens e seus significados. Ainda, encontra respaldo também em jornalistas e psicólogos maliciosos.

Naturalização da tortura
O problema maior do vídeo, além de propagar mentira e informações deturpadas para atender os próprios interesses religiosos do mantenedor da página, é a naturalização da tortura policial contra pessoas portadoras de tatuagem de palhaço. Veja, a tortura – que é um crime, diga-se de passagem – é um problema institucional, é um ranço não resolvido da Ditadura Militar e que deveria ter encontrado um fim. Noto que o Brasil é o único país que passou por uma ditadura militar e que se fala desse período com um saudosismo nefasto e hediondo. Aqui é o lugar onde assistimos pessoas sendo torturadas (e mortas) e achamos graça e compartilhamos o vídeo como se fora um grande feito, endossando assim o coro da legião de imbecis.

Mais espantoso é ver uma página cristã não dizer uma palavra sobre a tortura policial. A parte do amor cristão, bem, pularam…

Os fins do sensacionalismo é o próprio sensacionalismo
O vídeo termina com a imagem de uma criança de fraldas, com um desenho na barriga, brincando que está sendo tatuada. Obviamente que um alarde é feito sobre a situação, com ares de “é o fim do mundo”. Então, vemos uma criança feliz e brincando com os seus sendo alvo de críticas desse nível, enquanto é sabido que pastores usam da inocência de crianças ou até de suas possíveis enfermidades (falsificadas ou não) para conseguir mais dinheiro de seus fiéis. O peso e a medida e o mau caratismo me parecem desproporcional aqui e em todo resto.

Monetização da insensatez
Fim ao cabo é tudo sobre dinheiro, cada bobagem – por mais absurda – que eles digam, vai ter um fiel alienado doando algumas boas moedas. Até mesmo aquelas que ele não tem e isso, nessa nau dos insensatos, pouco importa. 

Porque nos importamos?
Bem, a pergunta deveria ser por que eu não me importo? Veja, enquanto uma fanpage produz um vídeo com esse conteúdo e milhares de pessoas compartilham, de fato, tem gente gente sendo espancada e torturada na rua por ter algum tipo de tatuagem; tem gente sofrendo ameaça de expulsão de casa por conta de tatuagem; tem gente não conseguindo emprego por conta da tatuagem; Não, não dá para ficar apenas achando que é engraçado, essa produção e reprodução de discurso de ódio – e é sobre isso que o vídeo trata – precisa ter fim. Nos importamos porque sabemos que para uma parcela das pessoas tatuadas, tudo o que vídeo diz é um problema real. Nem todo mundo vive na Rua Augusta ou em alguma outra parte privilegiada e hypada de alguma grande capital.  Pense nisso.

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