E as proteínas? Uma conversa sobre fisiculturismo e veganismo com o atleta Paru

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Fotos: Divulgação / Paru Vegan

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Circula no imaginário popular  a ideia de que pessoas que não se alimentam de carne e derivados de animais são fisicamente mais fracas ou mais propensas a desenvolver doenças. Parte dessa equivocada ideia é resultado de uma visão binária e maniqueísta de mundo e obviamente – bem – alimentada pela indústria da carne. É como se você tivesse duas únicas possibilidades para continuar vivo: comer carne ou não comer nada.

A verdade é que as possibilidades vão muito além disso tudo. É possível viver sem carne e sem consumir derivados de animais e – pasme -, viver muito bem. Inclusive é possível ter um ótimo rendimento e desempenho nos esportes e atletas do mundo inteiro têm nos mostrado isso dia após dia. No Brasil o número ainda é pequeno, principalmente no fisiculturismo, mas a presença crescente e a visibilidade dessas pessoas é acima de tudo a abertura de novas possibilidades para os novos tempos.

Conversamos sobre corpo e veganismo com o atleta Paru Vegan de Salvador, Bahia. Ele que é vegano desde 2001 já ganhou o 2º lugar nos Campeonatos Baianos de 2014 e 2015 na categoria Culturismo Clássico, acima de 1,80m. E obviamente que a capciosa ‘mas e as proteínas?”, não poderia faltar. Boa leitura, inspirem-se!

 

T. Angel: Você se tornou vegano aos 14 anos de idade e tem um histórico de obesidade. Conte para gente como era a sua relação com o corpo antes do veganismo e da musculação.
Paru Vegan: Minha relação com meu corpo era a pior possível, infância como criança obesa e sendo alvo de piadas e brincadeiras contribuíram para minha timidez e introversão. Nunca me aceitei gordo, não ficava sem camisa em casa, ia tomar banho de piscina e ficava de camisa. Não queria que as pessoas vissem como eu era, aquela fina camada de tecido era o que me protegia dos olhares e das piadas em relação ao meu tamanho e forma. Mesmo praticando esportes como karatê e ciclismo, eu nunca emagrecia. Gastava muita energia, mas também consumia muitos industrializados, que para mim eram reconfortantes.

 

T. Angel: Você poderia contar para gente como o fisiculturismo entrou em sua vida?
Paru Vegan: Tudo começou com a musculação recreativa, aquelas idas e vindas às academias com os colegas, era na verdade uma mistura de evento social diário com pratica de atividade física. Com o tempo fui percebendo o meu desenvolvimento e pegando gosto pela coisa, a elevação dos pesos moldavam meu corpo de forma a viver na linha tênue entre “o gordo e o forte”. Um corpo grande com braços de alto calibre me colocavam numa melhor aceitação social, que com o tempo foi ficando de lado e sendo puro prazer por treinar e a musculação virou uma dedicação diária, necessitando de disciplina e dietas apropriadas para a constante evolução.

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T. Angel: O que te motivou a se tornar vegano?
Paru Vegan: Ainda enquanto gordo pesquisava por dietas para emagrecimento, assim esbarrei nas dietas vegetarianas. Entre textos, sites e fóruns via e-mail, passei a ter contato com pessoas vegetarianas e veganas há muito tempo. Uma delas se ofereceu a me envia pelos Correios uma cópia do filme Meet Your Meat em CD (a internet discada daquela época não tinha capacidade de tráfego para tanta informação). Assistir o vídeo foi a gota d’água, associei a teoria sobre os maus tratos, que até então não foi suficiente para me converter, com a visualização de animais sofrendo e tendo suas vidas roubadas com propósito de consumo humano. Daquele instante em diante decidi ser vegano, depois fui ver sobre questões de saúde e como fazer na prática. Mesmo com a dieta vegetariana continuei gordo, apenas aos 17 anos fui me reeducar a ponto de emagrecer.

 

T. Angel: Existe uma ideia de que o veganismo é exclusivo para as classes economicamente mais favorecidas. Como você enxerga essa questão?
Paru Vegan: Bom, fui vegano numa cidade do interior da Bahia e meus país nunca foram ricos. Com um valor menor do que o que eles gastavam com carnes, eles compravam alguns vegetais e proteína de soja para mim. Aquilo não era caro e nem poderia ser, era veganismo simples e de raiz. Apenas removendo a carne do prato e elevando o consumo de cereais em detrimento de alimentos industrializados ultra processados. Algumas vezes faziam um capricho e compravam uma lata de leite em pó de soja, mas no mercado nem haviam opções veganas caras. O que de vegano estava ali era por acidente em sua composição. Não era um nicho de mercado, era a casualidade que me permitia comer algumas massas, biscoitos e pães.

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T. Angel: Você é um dos moderadores do grupo Musculação Vegana e acompanhando as atividades que acontecem por lá, percebo que existe um certo discurso conservador em relação ao corpo, principalmente ao nu. Como você particularmente lida com a questão?
Paru Vegan: O grupo já foi bem mais liberal, mas alguns participantes compartilharam com a gente que em alguma fase de suas vidas sofreram abusos sexuais e que o nu era um gatilho para suas péssimas lembranças. Então, por empatia, solicitamos que contornos sexuais não ficassem em evidência, já que o nudismo já não é permitido pela política do Facebook.

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T. Angel: Você vem conquistando alguns títulos em campeonatos, fale um pouco sobre isso…
Paru Vegan: Eu tenho pouco tempo de competição, apenas 2 anos e meio e tenho 2 títulos estaduais de vice-campeão. Como o fisiculturismo é muito desgastante, ainda não consegui ter um volume de competições alto, coisa que deve acontecer com o passar do tempo e com o aprendizado com as respostas e individualidades biológicas do meu corpo. 

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T. Angel: Notamos que você além de modificar o seu corpo através de exercícios físicos, também carrega algumas tatuagens. O que você pode nos contar sobre elas?
Paru Vegan: Aos 18 anos a minha primeira tatuagem foi sobre o veganismo, tenho escrito vegan na porção superior da dorsal. Foi uma forma de dizer a todos que aquela era a minha única certeza na vida, a melhor decisão que já tomei e que não tinha vergonha de ter optado viver sem prazeres e bens materiais cujo preço fosse dor, exploração e morte. Com o passar dos anos fui fazendo outras, tenho um braço em tribal Maori com brotos de samambaia que significam proteção, uma moto pixelada na panturrilha direita, que representa minha paixão por motocicletas e velocidade. No tornozelo esquerdo tenho uma espiral de Fibonacci, que é a representação visual da evolução do número de Fibonacci, tido como o número perfeito, um elo entre a matemática e a natureza, presente em várias situações do universo. E últimas que fiz foi uma inscrição em alemão na cintura dizendo “Força, Foco e Fé”, para não esquecer dos meus objetivos e transcrevi um desenho de um crânio feito por Leonardo da Vinci, que faz parte da sua coleção de ilustrações sobre anatomia humana, que para mim representa o mesmo que outras caveiras: que por baixo da pele somos todos iguais.

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T. Angel: Além do exercício e tatuagem, tem algum outro tipo de modificação em seu corpo?
Paru Vegan: Um alargador na orelha direita e um piercing na língua.

T. Angel: Como está o atual cenário de atletas veganos no Brasil?
Paru Vegan: No fisiculturismo o cenário é formando por mim e Felipe Garcia, o Fefeu. Somos os únicos dois competidores em atividade, mas tem outros vindo! Nos demais esportes temos veganos em várias áreas, principalmente em provas de resistência como maratonas, ciclismo, corridas de montanha e Iron Man. E muitos ganhando prêmios e obtendo excelente colocações. O cenário só tende a crescer, a cada dia mais pessoas tem seus sentidos aguçados para o veganismo e mais veganos se interessam pela pratica de esportes. 

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T. Angel: O que você poderia dizer para quem pretende trilhar o caminho do fisiculturismo e veganismo?
Paru Vegan: Siga o seu coração. Hoje em dia já temos muita informação na Internet e o principal: muitos exemplos. Com pesquisa, dedicação e disciplina qualquer pessoa pode moldar o seu corpo sem depender de produtos roubados dos animais.

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T. Angel: Para quem quiser acompanhar o seu trabalho, como deve fazer?
Paru Vegan: Posto minha rotina através da página no facebook e do instagram @paruvegan. Quem quiser mais informações ou compartilhar experiências com outros veganos esportistas existem os grupos Musculação Vegana e Força Vegana, ambos no Facebook.

 

T. Angel: E as proteínas? risos
Paru Vegan: risos Elas estão aqui em meu corpo, nos animais e nas plantas. E no que depender de mim elas continuarão pertencendo aos animais, a minha fonte proteica vem exclusivamente dos vegetais!

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Deixamos aqui um agradecimento ao Paru pela atenção e disponibilidade em conversar conosco. Sucesso em sua estrada, estamos daqui torcendo por você.

CONTATO
https://www.facebook.com/fisiculturistavegano

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5 thoughts on “E as proteínas? Uma conversa sobre fisiculturismo e veganismo com o atleta Paru”

  1. Mais uma matéria muito bem escrita, parabéns. Eu pretendo fazer uma pesquisa onde vou incluir teu blog, tu pode entrar contato comigo ou passar teu email T.Angel, pra eu ter mais algumas informações. agradeço desde já.

    Abraços.

  2. À base de uma alimentação vegetariana bem equilibrada, é possível, sim, suprir as necessidades proteicas para ‘sobreviver’; já que para ter proteína não precisa necessariamente ingerir a mesma, bastando apenas a ingestão dos aminoácidos, presentes em qualquer tipo de alimento. No entanto, a complicação está na ingestão de vitaminas e outros nutrientes (ferro heme, por exemplo), e quando se trata de crescimento muscular, não basta apenas ingerir o suficiente para sobreviver, mas muito além disso.

    Ele pode até nao ingerir alimentos derivados de animais, mas ninguém cresce desse jeito só à base de vegetais. Ele toma, sem dúvida, suplementos alimentares, exteróides anabolizantes, termogênicos, diuréticos, etc. E nem que ingerisse derivados de animais não cresceria tanto assim.

    Entendo a argumentação moral acerca dos direitos do animais, no entanto, deve-se tomar muito cuidado ao mexer na alimentação, com saúde não se brinca!

    1. Caro Carlos, é possível sim ‘crescer desse jeito’ só a base de vegetais. Procure por ‘plant based athlete’ e encontrará uma enormidade de atletas gigantes.

      E você realmente acredita que atletas desse nível não sabem que ‘saúde não se brinca’ e que devem ter ‘cuidado na alimentação’? Meio inocente seu argumento, não concorda?

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