Mariê Marques estampa capa de revista de tatuagem

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As capas das revistas de tatuagem brasileiras expressam – de modo bastante explícito – as mentalidades e interesses que circulam dentro da comunidade da modificação corporal. Quase sempre em sintonia com o que está fora dela, no sentido, por exemplo, no campo estético. E não se esqueçam que toda estética é política e que toda política é estética

Quando visitamos os diferentes acervos das revistas de tatuagem que se iniciam lá no começo dos anos 90 do século passado, percebemos a manutenção dos ideais dos corpos magros, sem deficiência, jovens, brancos, cisgêneros e heterossexuais. Quase sempre também sexista, machista, pois usava a imagem das mulheres tatuadas de modo objetificado. A proposta era vender revista.

A lógica era clara, a indústria da tatuagem era composta majoritariamente por homens cisgêneros e heterossexuais, a venda de um produto – no caso a revista – precisava atender aos interesses desse grupo que detinha o poder de compra. Gostamos aqui de usar o tempo verbal no passado, embora não estejamos ainda plenamente satisfeitas.

Em passos lentos vamos assistindo uma quebra nesse padrão dentro da comunidade da modificação corporal (e fora dela também). E mesmo sendo lento, quando identificado, precisa ser celebrado.

O mês de Maio é marcado pela publicação da edição nº 62 da Revista Tattoo Brasil. A capa é estampada pela modelo e tatuadora Mariê Marques, a primeira mulher trans a vencer um concurso de Miss Tattoo no Brasil. Mariê também leva e carrega em sua história pessoal e na nossa história coletiva – enquanto comunidade – a marca de ter sido a primeira mulher trans em uma capa de revista de tatuagem nacional.

Não é pouco. Usualmente o interesse em corpos trans e travestis pela imprensa está voltado para tragédia e todo tipo de infortúnio. Não é pouco. Abrir possibilidades para outras jovens trans e travestis que queiram e sonham em se tornarem tatuadoras ou modelos alternativas. Não é pouco. Abrir janelas para os sonhos e para a vida, no país que mais mata mulheres trans e travestis em comparação com o restante do mundo.

“Pra mim, você sabe, pra gente que é pessoa trans, estar na capa de uma revista, para mim é muito foda. Eu estou muito feliz com isso. Ainda mais por ser a primeira trans a estar na capa, diante de tudo que se passou na minha vida no meio da tatuagem, no meio da body modification em si, porque eu sou uma pessoa modificada. Então, eu estar lá, ter passado por tudo que passei e hoje ser capa de uma revista de tatuadores do Brasil inteiro, acho isso muito foda” , nos contou Mariê Marques, naqueles momentos que comemoramos a ocupação de um novo espaço.

Que Mariê Marques seja a primeira e não a última. Seguimos escrevendo as nossas histórias e intervindo no mundo com os nossos corpos com a intenção de transformá-lo radicalmente em algo melhor.

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