Rosas de Ouro apresentou desfile sobre a história da tatuagem no Carnaval 2016

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CARNAVAL 2016 ANHEMBI(Foto: reprodução G1/Flavio Moraes)

“A mão marcou na pedra essa história
Nascia a primeira cicatriz
exposta na pele como troféu
esculpida em rituais
orgulho na alma do guerreiro
essa herança dos tribais
por muito tempo a religião proibiu
o som do tatau, no ocidente, evoluiu
Marcando novas gerações
Rebelde em seu jeito de ser
Na velocidade da luz
A muitos seduz, vem ver”
Rosas de Ouro –  “Arte à Flor da Pele. A Minha História Vai Marcar Você”

Quem acompanhou os desfiles das escolas de samba de São Paulo, deve ter ficado sabendo que a Rosas de Ouro flertou com a história da tatuagem. O samba enredo ‘Arte à Flor da Pele. A Minha História Vai Marcar Você’ fez um passeio histórico e uma belíssima homenagem a prática cultural de marcar o corpo que tem se dado em diferentes tempos e espaços.

rosas-ouro_caio_kenji-g1_img_4842(Belíssima imagem do desfile. Foto: reprodução G1/Caio Kenji)

A escola de samba fez a sua função, se aproximou intimamente do tema, esteve presente em convenções de tatuagens, fez pesquisa no Museu Brasileiro de Tatuagem e manteve uma relação com importantes nomes nacionais como Polaco, Leds e Enio Conte, idealizador da Tattoo Week.

O resultado dessa aproximação e pesquisa pode ser visto no desfile. Há um reconhecimento bastante claro da tatuagem como uma prática cultural e fenômeno social e isso foi interessante de se ver e ouvir. Passagens pela África e a invasão e colonização da América estiveram presentes nas alas e carros alegóricos, desde a comissão de frente. Assim como se mostrou presente a força e a importância da tatuagem na música e movimentos de contracultura, o resgate das tribos urbanas que foram super importantes para as décadas de 80 e 90, a paixão da tatuagem e o futebol e até as crianças que rabiscam o corpo em alusão as tatuagens teve um espaço. Também uma passagem pelos circos de horrores, que infelizmente foi acompanhada de um comentário transfóbico e sexista de um jornalista da Globo, quando muito poderia ter sido dito sobre o assunto. Obviamente sem esquecer de mencionar a tatuagem carcerária, houve um carro alegórico específico sobre o assunto.

CARNAVAL 2016 ANHEMBI(Comissão de frente da Rosas de Ouro. Foto: reprodução G1/Flavio Moraes)

Ainda que houvesse uma riqueza em dados e informações históricas, que era obviamente sobre tatuagem e ao mesmo tempo sobre tantas civilizações, culturas e claramente do próprio carnaval, a grande imprensa se perdeu no sexismo cotidiano e piadas bobas e datadas. Assistindo e ouvindo os comentários durante o desfile a sensação era a de que todos ali estavam perdidos sobre o tema a qual a Rosas de Ouro resolveu homenagear. Lendo os principais jornais e sites noticiando o desfile a sensação era a de que os profissionais do jornalismo estavam completamente alienados, repetindo imagens das musas nuas em looping para esconder toda a miséria sexista em que estavam se afogando. A sensação era a de que são profissionais tão alienados do corpo nu que não conseguiam desviar o assunto e foco. Fora os que se perdem, há os que usam desse sistema sexista de modo bastante consciente, assim, obviamente que não podemos deixar de citar o bloco dos profissionais que não param de objetificar o corpo da mulher, sexualizar e capitalizar a nudez.

zzz (Recortes de algumas matérias sobre o desfile)

Os comentaristas do desfile assumiam publicamente o preconceito com a tatuagem, tentavam depois se corrigir, mas já era tarde demais. Alguns diziam que não imaginavam que através da história da tatuagem pudesse se contar tanto sobre a história humana. Outros se maravilhavam em como conseguiam aprender através dos desfiles. Um carro alegórico em homenagem ao Lucky Tattoo passava pela avenida e houveram alguns comentários clichês e simplistas, que provavelmente estava na sinopse do desfile. Um carro alegórico que trazia como destaque importantes nomes da história da tatuagem nacional, tão importante que sem eles o desfile não teria acontecido – porque a própria tatuagem não teria acontecido como aconteceu – e nenhuma menção, nenhuma mínima visibilidade. O que nos faz confrontar com a ideia patética de que é preciso morrer para se ter algum reconhecimento. História não é só sobre o passado e gente morta, e ao ignorar a presença das pessoas tatuadas e profissionais da tatuagem que ali estiveram, os comentaristas e a grande imprensa perderam a chance de prestigiar e dividir com toda gente a cereja do bolo e, quem sabe, sair do senso comum.

rosas-ouro_caio_kenji-g1_img_5007(Tatuadores em destaque no carro alegórico. Foto: reprodução G1/Caio Kenji)

rosasouro(Carro alegórico em homenagem ao Lucky Tattoo. Foto: reprodução/Estadão)

Não imaginávamos que fossemos ver agora um desfile homenageando a tatuagem e que bom que vimos. Vimos através do trabalho da Rosas de Ouro uma afirmação e reconhecimento da tatuagem como prática cultural e isso é algo muito importante, fomenta muitos debates. Ficamos aqui maravilhados com a ideia de que tantas pessoas puderam ter um contato mais próximo com o assunto, ainda que a grande imprensa tenha feito um serviço deveras ruim, torcemos para que as pessoas filtrem e absorvam a beleza da cultura que foi mostrada no samba enredo e toda construção artística da escola. Há muito para se ver e refletir.

 

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