Bixa Travesty é um filme brasileiro de 2018 dirigido e escrito por Claudia Priscilla e Kiko Goifman. Ambas com um extenso currículo no campo do audiovisual, premiadas e reconhecidas nacional e internacionalmente na área do cinema. Claudia e Kiko, inclusive, já se aventuraram no mundo da modificação corporal em 2009 com a série HiperReal para o SescTV. Um trabalho sensível e um olhar atento sobre práticas de diferentes usos do corpo.
No filme Bixa Travesty, o corpo político de Linn da Quebrada, cantora transexual negra, é a força motriz desse documentário que captura a sua esfera pública e privada, ambas marcadas não só por sua presença de palco inusitada, mas também por sua incessante luta pela desconstrução de esteriótipos de gênero, classe e raça.
As diretoras da obra dizem que não é apenas um filme sobre a Linn da Quebrada, mas um filme com a Linn da Quebrada, uma vez que a artista assina também o roteiro e foi muito ativa na construção do longa.
O filme estreou no Festival Internacional de Cinema de Berlim em 18 de fevereiro de 2019 e venceu o Teddy Award de melhor documentário LGBTQIA+. Circulou em diversos festivais no exterior, inclusive na Tunísia, onde ser homossexual é ainda hoje considerado crime, com punição de 3 anos segundo o Artigo 230 do Código Penal.
Em suas andanças festivais afora, o Bixa Travesty recebeu diversos prêmios, dentre eles: Melhor Documentário no Milan International Lesbian and Gay Film Festival (2018), Prêmio de Juri do Merlinka festival (2018), Melhor Documentário de Longa-metragem no Madrid International Documentary Film Festival (2018), Prêmio de Juri Especial no Inside Out Toronto LGBT Film Festival (2018), Grande Prêmio Chéries-Chéris (2018), Melhor Direção de Documentário no Cartagena Film Festival (2018).
Hoje, 12 de Setembro de 2019, aconteceu a estreia do filme na Argentina e as exibições seguirão nos próximos dias. Contando não apenas com a exibição do filme, mas com atividades extras como conversas e diálogos sobre questões que rondam o corpo, a sexualidade e o gênero.
No Brasil o filme ainda não tem data de estreia e, sim, você está certa se pensou que a conjuntura política que estamos tem influenciado nesse processo. E sobre isso, precisamos conversar um pouco.
Bixa Travesty foi exibido em três ocasiões especiais e pontuais no Brasil, todas elas em São Paulo. Em novembro de 2018 tivemos a primeira exibição durante o 26º Festival Mix Brasil. No Centro Cultural São Paulo – CCSP houve uma sessão fechada no evento Cinema em Transe durante o mês do orgulho LGBTQIA+. E em julho, durante o 14º Festival de Cinema Latino Americano de São Paulo, ocasião em que Claudia Priscila estava sendo homenageada no festival.
No final da exibição que ocorreu no Festival de Cinema Latino Americano de São Paulo, as diretoras e o elenco conversaram com o público presente e contaram sobre as dificuldades em se lançar o filme no Brasil.
Para que tenhamos noção do nível do abismo em que estamos, não é só Bixa Travesty que tem encontrado barreiras tantas. Hoje foi divulgada nota para imprensa nacional comunicando que o filme Marighella dirigido por Wagner Moura teve o lançamento cancelado. Abaixo a reprodução do pronunciamento divulgado:
“Nós, produtores do longa-metragem “Marighella”, dirigido por Wagner Moura, anunciamos que a data de lançamento do filme nos cinemas brasileiros, divulgada anteriormente para 20 de novembro de 2019, está cancelada.
Os produtores haviam escolhido o mês de novembro, que marca os 50 anos de morte de Carlos Marighella, e o dia 20, da Consciência Negra, para a estreia. No entanto, a O2 Filmes não conseguiu cumprir a tempo todos os trâmites exigidos pela Ancine (Agência Nacional do Cinema).
“Marighella” segue sendo apresentado com muitos sucesso em vários festivais de cinema no mundo. Nosso objetivo principal sempre foi a estreia no Brasil. Os produtores e a distribuidora Paris Filmes vão seguir trabalhando para que isso aconteça.“
O governo de Jair Bolsonaro tem tido muitos problemas com a Ancine (não só com ela, como sabemos), agência que um porta-voz do governo já chegou a afirmar ter a intenção de reformular para que trabalhe apenas com projetos com um “sentimento cristão”, ignorando (mais uma vez) a laicidade do Estado. Em agosto, Bolsonaro demitiu o diretor da Ancine e afirmou buscar um substituto com visão “evangélica”. O nome disso que está acontecendo é censura, tanto quanto a que aconteceu na Bienal do Livro do Rio de Janeiro pelo prefeito Marcelo Crivella, como a que aconteceu nas escolas estaduais pelo governador João Dória.
Tenhamos consciência: o que temos assistido desde a chegada de Jair Bolsonaro à presidência é a censura sendo colocada em ação em ritmo crescente como prática política típica de regimes autoritários e ditatoriais. Não apenas por ele, obviamente, mas por todos que chegaram ao poder em sua sombra. Sendo como aliado declarado ou como aqueles que tentam se distanciar da figura do presidente por interesses pessoais e projetos políticos particulares, mas que se articulam politicamente com os mesmos princípios.
Claudia Priscilla e Kiko Goifman insistem que ainda em 2019 teremos o lançamento de Bixa Travesty no Brasil. Torcemos e esperamos muito para ver isso acontecendo. Seguimos atentas!